A ditadura
militar ainda é um tema extremamente polêmico no Brasil. Os 21 anos de
repressão política, mídia censurada e violação dos direitos humanos fazem desse
assunto extremamente relevante para o país. Nesta segunda-feira (31),
completam-se os 50 anos desde o Golpe Militar de 1964. Em parceria com o professor Elias Feitosa de Amorim
Jr., do Cursinho da Poli, a Universia Brasil reuniu 50 coisas que todo estudante deve saber sobre a ditadura
militar.
1 - Cinema Novo (Gláuber Rocha):
A proposição do Cinema Novo estava em busca de uma linguagem própria, sem se
preocupar com os padrões de Hollywood, explorando as discussões estéticas
(fotografia, edição, música) para se pensar um cinema de arte e não uma simples
"encenação" de imagens, pois a reflexão e o questionamento ocupavam o
centro das atenções.
2 - MPB: Engajamento (Chico Buarque, Caetano, Gil, Elis Regina, Milton Nascimento)
X Alienação da Jovem Guarda (Roberto e Erasmo Carlos, Vanderleia, Roni Von)
A produção musical durante o Regime Militar foi muito grande e diversificada,
mas um embate era perceptível: de um lado a música engajada preocupada com o
momento político e de outro, a inspiração/reprodução do "padrão USA" sem envolvimento com as questões sociais ou políticas do
país.
3 - Teatro Oficina e Teatro de Arena:
Encenar, pensar, questionar e, principalmente, "devorar" a tradição
do teatro e dela fazer brotar algo novo, dinâmico e intenso, rompendo os
esquemas clássicos. Foi assim que José Celso Martinez Correa se colocou com o Oficina e Antunes Filho, Sérgio Brito,
Gianfrancesco Guarnieri, Augusto Boal com o Arena.
4 - Inovações nas Artes Plásticas: Hélio Oiticica, Lygia Clarck
Oiticica transitou entre os músicos da MPB, viu o Tropicalismo nascer, trazendo uma arte conceitual rica e brasileira, que
abusava do espaço e das formas, reinventando-os. Lygia Clarck buscou tanto na
pintura quanto nas esculturas e performances que realizou re-significar o fazer
artístico, o papel do artista e a experimentação.
5 - Autores e obras: Ferreira Gullar, Rubem Fonseca, Henfil, Pasquim
Em tempos de censura e dureza, escrever uma literatura engajada não era fácil e
tranquilo, pois a vida se colocava em risco. Censura, proibições de edição e
publicação foram dificuldades enfrentadas por Gullar e Fonseca, mas sua
produção não morreu, assim, como Henfil, Ziraldo, Milôr Fernandes, Jaguar,
Paulo Francis começaram a partir de 1969 a escarnecer aqueles anos
de chumbo, fazendo da produção e circulação clandestina de charges e textos
até o fim do AI-5 em 1979, depois continuaram a criticar tendo maior espaço,
nem sempre se valendo de pudores para atingir os militares.
6 – Juscelino Kubitscheck e Ulysses Guimarães
O golpe teve o apoio de figuras importantes do cenário político brasileiro, e
que depois se arrependeriam. Por exemplo, o ex-presidente Juscelino
Kubitscheck e Ulysses Guimarães.
7 - A Presidência “vaga”
O presidente do Congresso, senador Auro Moura Andrade, declarou a Presidência
“vaga” quando o presidente João Goulart ainda estava em território
brasileiro.
8 – João Goulart eleito
João Goulart foi eleito em 1960, como vice na chapa de Janio Quadros.
9 – Votos separados
Naquela época, votava-se em separado nos candidatos a presidente e vice. Jango,
do PTB, era candidato a vice na chapa do marechal
Teixeira Lott, um militar nacionalista. Janio (PTN/UDN) tinha como vice o mineiro Milton Campos.
10 - Partido Comunista não legalizado
No momento do golpe, o Partido Comunista não estava legalizado, mas atuava quase abertamente, elegendo
parlamentares por outras legendas como o PTB e o PST.
11 – “Eleições” indiretas
Os milicos tentavam dar um verniz constitucional à ditadura. Por isso, faziam
“eleições” indiretas (o presidente e o vice eram escolhidos pelo Congresso,
frequentemente expurgado com cassações de parlamentares de oposição). Em 1969,
com a doença de Costa e Silva, deveria assumir o vice que
era um civil, Pedro Aleixo, que se opusera à decretação do AI-5 em dezembro de
1968. Então, os generais impediram a posse de Aleixo e uma junta militar,
formada pelos ministros do Exército, Marinha e Aeronáutica, assumiu o poder,
até que os comandantes do Exército escolhessem um sucessor de Costa e Silva,
que foi o general Emílio Garrastazu Médici.
12 – Sérgio Macaco
Um dos grandes injustiçados pela ditadura foi o capitão da Aeronáutica Sérgio
Miranda Ribeiro de Carvalho, o “Sérgio Macaco”. Ele se recusou a cumprir as
ordens de seu superior, o brigadeiro João Paulo Burnier, que planejava usar o Parasar (unidade de salvamento de paraquedistas da Aeronáutica) para
cometer atos terroristas no Rio de Janeiro – como a explosão do Gasômetro – para
depois atribuí-los aos comunistas, como pretexto para radicalizar o regime.
Sérgio Macaco foi preso, cassado, perdeu a patente e só teve seus direitos
recuperados depois da morte, em 1994.
13 - “Terroristas”
Os militares justificaram a tortura – quando a admitiam. Frequentemente a
negavam – sob a desculpa de que estavam em guerra contra “terroristas”. Mas uma
parte dos presos políticos que foram torturados e assassinados pelo regime
jamais pegou em armas, como o ex-deputado Rubens Paiva, morto em 1971, e o
jornalista Vladimir Herzog, assassinado em 1975, e parte
da cúpula do Partido Comunista Brasileiro (PCB), cuja oposição à luta armada
não a impediu de ser exterminada em 1974/1975.
14 – Primeiro governo da ditadura
O primeiro governo da ditadura, Castello Branco, era dominado por monetaristas, isto é, privilegiava a abertura
ao capital estrangeiro e políticas de austeridade para combater a inflação, com
cortes de gastos públicos.
15 – Getulismo-juscelinismo
A partir de Costa e Silva, o regime retomou, com modificações, o modelo
nacional-estatista do getulismo-juscelinismo, que privilegiava o
desenvolvimento econômico baseado no tripé empresas estatais, privadas e
estrangeiras.
16 – Empréstimos externos
Ao contrário do que aconteceu na Argentina e no Chile, onde os milicos optaram
pelo monetarismo duro e puro, o Brasil usou os empréstimos externos para
desenvolver um grande parque industrial. O modelo nacional-estadista
começou a se enfraquecer depois da crise econômica internacional de 1982.
17 – Militares decidem permanecer no poder
Os líderes civis que apoiaram o golpe – Carlos Lacerda, Adhemar de
Barros e Magalhães Pinto– esperavam que os militares afastassem Jango
e devolvessem o poder aos civis depois de “depurá-lo” com as cassações. Haveria
eleições presidenciais em 1965 e Lacerda de JK eram os favoritos. Mas os
militares resolveram ficar no poder: alienaram as lideranças civis, tornaram as
eleições indiretas e aboliram os partidos tradicionais. Adhemar e JK foram
cassados e Lacerda, descartado, foi para a oposição. Em 1966, ele articulou com
seus arqui-inimigos Jango e JK uma frente de oposição à ditadura, a Frente
Ampla. Acabou cassado com o AI-5.
18 – Inimigos da ditadura
Os grandes inimigos da ditadura, Carlos Marighella e Carlos Lamarca, foram assassinados friamente pela repressão quando poderiam ter
sido presos. Marighella inclusive estava desarmado quando foi emboscado pela
equipe do delegado Sérgio Fleury, com cerca de 30 policiais, em novembro de
1969. Lamarca estava subnutrido e sem nenhuma condição de combate quando foi
executado no sertão da Bahia em 1971.
19 – Henning Boilesen
O empresário dinamarquês Henning Boilesen foi um dos principais incentivadores
da repressão política. Ele promoveu uma “caixinha” entre os empresários
paulistas para financiar a Oban (Operação Bandeirante), que centralizou a repressão política num núcleo de oficiais das
Forças Armadas e agentes policiais, sendo o embrião dos DOI-Codi. Segundo
testemunho de presos, Boilesen gostava de assistir a sessões de tortura. Foi
executado por guerrilheiros em 1971.
20 – Lei da Anistia
A Lei da Anistia, de 1979, foi imposta pelo regime à
sociedade e não negociada. Ela comparou as ações dos guerrilheiros e militantes
da oposição à dos agentes da repressão. Até hoje, os milicos rejeitam a revisão
da anistia e falam em “crimes dos dois lados”. O problema é que os guerrilheiros
foram todos julgados, condenados e, muitas vezes, torturados e mortos sem
julgamento, enquanto que, até hoje, nenhum agente da repressão foi sequer
processado por seus crimes. E em países como Argentina, Chile e Uruguai, as
leis de anistia foram revogadas e os militares processados, julgados e presos.
Só agora, com a Comissão da Verdade, o país começa a tomar conhecimento do
destino de alguns de seus “desaparecidos”.
21 – Revisionismo histórico
Está em voga uma onda de “revisionismo” histórico. Há anos o jornal Folha de S.
Paulo – que apoiou o golpe – popularizou o tema ‘ditabranda’, argumentando que a ditadura brasileira não foi tão cruel quanto
às da Argentina e do Chile. Historiadores de direita, como Marco Antônio Vila,
afirmam que a ditadura durou apenas 11 anos, de 1968 a 1979, que foi o período
de vigência do AI-5. No primeiro caso, vale notar que um regime de exceção não
se caracteriza pelo número de mortos, mas pelos riscos impostos à dissidência
política. Em segundo lugar, é preciso lembrar que no período pré-AI-5 a
ditadura prendeu, cassou, torturou e censurou, embora em menor escala, e
governou por decretos, mudando a Constituição ao seu bel prazer quando foi
contrariada nas urnas. E, depois do fim do AI-5, os agentes do porão agiram impunemente
e cometeram atentados como os do Riocentro, em 1981.
22 – Operação Condor
A Operação Condor reuniu as ditaduras do Brasil, Argentina, Chile, Uruguai e
Bolívia, que fizeram uma “joint-venture” para perseguir opositores
desses países e intercambiá-los. Assim, vários argentinos e uruguaios
perseguidos foram presos pela política brasileira e devolvidos a seus países,
assim como brasileiros foram presos na Argentina, Chile e Uruguai e devolvidos
à repressão aqui. Outros entraram na lista dos “desaparecidos”. Um deles foi o
músico Tenório Jr., que viajava a Buenos Aires com Vinícius de Moraes; ele foi
detido e nunca mais foi visto.
23 – Autonomia militar
Durante o governo do general Médici (1969-1974), que fora “eleito” pelo Alto
Comando do Exército, os militares ganharam enorme autonomia em relação ao Poder
Executivo, que ser tornou mero delegado das Forças Armadas.
24 – Médici
O sucessor de Médici, Ernesto Geisel, teve que se impor à caserna
para ter as mãos livres para ditar os rumos do regime. Para isso, ele teve que
impor a disciplina de comandante-em-chefe sobre as Forças Armadas. Para
enfrentar a linha-dura e impor seu projeto de abertura controlada, Geisel
afastou dois generais: o comandante do II Exército, Ednardo D’Ávila Melo,
depois da morte de dois presos políticos no DOI-Codi de São Paulo, e o general Sylvio
Frota, ministro do Exército, que queria suceder Geisel no Planalto.
25 – Guerrilha do Araguaia
A guerrilha do Araguaia, uma tentativa do PCdoB de instalar uma base na
Amazônia, foi descoberta pelo Exército em 1972, mas os militares precisaram
realizar várias expedições secretas, as últimas com tropas especiais
(paraquedistas e agentes federais) para eliminar pouco mais de 70
guerrilheiros. As Forças Armadas nunca admitiram que houvesse uma guerrilha no
Araguaia e até hoje se recusam a dar informações sobre os corpos dos
guerrilheiros. A ordem para exterminar os sobreviventes partiu do comando do
Exército (general Orlando Geisel) com a anuência de Médici.
26 – Ditadura cívico-militar
Hoje está em voga à designação que se deve dar ao regime. Antigamente,
falava-se simplesmente que era uma ditadura militar. Hoje, muitos estudiosos
dizem ‘ditadura cívico-militar’ e ‘golpe cívico-militar’ para
enfatizar a participação de civis tanto na derrubada de Jango quanto no
exercício do poder. A discussão está aberta, mas convém notar que, se é correto
falar em ‘golpe cívico-militar’ em razão do envolvimento de amplos setores
civis – empresários, imprensa, igreja, políticos conservadores – na conspiração
contra Jango, é mais difícil classificar o regime como ‘cívico-militar’. Apesar
de amplo apoio das elites empresariais, o regime era dirigido pela cúpula do
Exército, que adquiriu grande autonomia em relação à sociedade civil.
27 – Telenovelas
As telenovelas foram um dos principais alvos da censura durante o período
militar. Foi estabelecido que as emissoras devessem enviar a sinopse e o perfil
de todos os personagens para análise do DCDP (Divisão de Censura de
Diversões Públicas) que, por sua vez, poderia cortar quaisquer
cenas ou personagens que fossem considerados “pesados”.
28 – O Milagre Econômico
O Milagre Econômico, ocorrido durante o governo do general Médici, aumentou a
dívida externa em números alarmantes, assim como a inflação (no período, entre
15% e 25% ao ano).
29 – Clarice
Clarice Lispector, autora de obras famosas como “A Hora
da Estrela”, foi extremamente pressionada pelos críticos a assumir uma
posição mais consolidada durante a ditadura militar. Para ela, o papel dos
escritores era “falar o menos possível”.
30 – Marcha da Família
A “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” foi uma série de eventos
ocorridos em março de 1964, nos quais meio milhão de brasileiros foi às ruas de
São Paulo para protestar contra a chamada “ameaça comunista” do presidente João
Goulart.
31 – AI-1
AI-1 – O Ato Institucional n° 1 permitia o a cassação de
mandatos e a suspensão dos direitos políticos. Os primeiros cassados foram João
Goulart, Jânio Quadros, Luís Carlos Prestes, Leonel Brizola e Celso Furtado.
32 – AI-2
AI-2 – O Ato Institucional n° 2 dissolveu todos os partidos
políticos e instituiu a eleição indireta para presidente da República.
33 –AI-3
AI-3 – O Ato Institucional n° 3 estabeleceu as eleições
indiretas para governador e vice-governador.
34 –AI-4
AI-4 – O Ato Institucional n° 4 estabeleceu a Constituição de
1967.
35 – AI-5
AI-5 – Proibiu manifestações, suspendeu direitos políticos e deu ao
presidente o poder de intervir em estados e municípios. Também vetou o habeas
corpus para crimes políticos e instalou a censura militar.
36 – Sem o direito de se manifestar
Em novembro de 1964, foi publicada uma lei que extinguia a UNE (União
Nacional dos Estudantes) e proibia as organizações
estudantis de protestar.
37 – MPB
Em outubro de 1967, no 3° Festival da Música Popular Brasileira, artistas como Gilberto Gil, Os Mutantes, Caetano Veloso
e Chico Buarque apresentam suas composições, muitas vezes
dotadas de significado implícito.
38 – Caminhada pelo Rio de Janeiro
1968: após manifestações duramente reprimidas pelo regime militar, o governo
aceita um protesto com data e local combinados. Artistas, estudantes,
intelectuais, sindicalistas e a população formam uma multidão de 100 mil
pessoas no Rio de Janeiro para protestar contra as violências da
ditadura.
39 – Imprensa
A imprensa também sofreu com a censura durante o período militar. Os veículos
de comunicação eram obrigados a enviar os seus materiais previamente e estavam
sujeitos aos grossos olhos da Divisão de Censura do Departamento de
Polícia Federal.
40 – Apenas dois partidos políticos
Quando os partidos políticos foram dissolvidos, foi instituído o
bipartidarismo: a Aliança Renovadora Nacional (Arena), de apoio ao governo, e o Movimento Democrático
Brasileiro, da oposição.
41 – Exilados
Geraldo Vandré, Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque são alguns nomes
de artistas que foram exilados durante a ditadura militar.
42 – Aquele Abraço
E por falar em Gilberto Gil, a canção “Aquele Abraço” foi escrita após a sua prisão em um camburão. O músico
acreditava que seria morto naquele período.
43 – Comando de Caça aos Comunistas
O Teatro Ruth Escobar foi invadido pelo Comando
de Caça aos Comunistas (grupos estudantis que incluíam
universitários de instituições como o Mackenzie). Os atores foram agredidos e o
teatro foi destruído.
44 – Disciplinas extras
Nas escolas, a grade horária incluía aulas de Organização Social e
Política Brasileira eEducação Moral e Cívica. Os estudantes também eram obrigados a entoar o Hino Nacional
Brasileiro todos os dias.
45– Censura didática
Os livros adotados na escola e os termos que podiam ser utilizados em sala de
aula também eram vítimas da repressão militar. Professores de colégios e
universidades eram vigiados pelos oficiais.
46– DOI-CODI
O DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de
Operações de Defesa Interna) foi um órgão destinado a
combater inimigos que ameaçariam a segurança nacional.
47– DOPS
Os objetivos do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) já eram mais claros: reprimir movimentos sociais e políticos
contrários aos militares no poder. Ambos os departamentos utilizavam a
violência para suas ações.
48– Formas de tortura
Entre os métodos de tortura utilizados pelos oficiais do DOPS e do DOI-CODI
estavam os choques, afogamentos, espancamentos e a “geladeira”, um local onde
os presos eram mantidos sem comida ou água enquanto a temperatura subia e
descia.
49– A ditadura no cinema
“O Dia Que Durou 21 Anos”, “Jango” e “Zuzu Angel” são filmes que retratam o período
da ditadura militar no Brasil.
50– Vladimir Herzog
A morte do jornalista Vladimir Herzog foi um
dos principais temas discutidos pela Comissão da Verdade. Em 2012, o atestado de óbito de Herzog foi retificado de
“suicídio” para “decorrente de lesões e maus-tratos”.